TEXTOS

“A vida e morte da margarida”

 

curadoria de Elisabete Belotto – Setembro 2009 – CCJPBoéssio/SL

Fazer arte. Viver a arte, viver de arte. Tarefas que cotidianamente nos fazem pensar e repensar nossas escolhas.

No mundo atual, visual e digitalizado, o que é capaz de nos mover para utilizarmos de suportes tradicionais para criarmos espaços de diálogos conosco e nossos semelhantes? Que motivação interna é essa que nos faz tomarmos nossos pincéis e tintas e com eles, a exemplo de nossos antepassados, deixarmos nosso registro impresso pictoricamente?

Temos à nossa disposição atualmente uma variedade de mídias utilizáveis capazes de nos dar respostas e retorno satisfatório imediato aos nossos projetos e propostas criativas. Basta “dominarmos a máquina”! Porém, o que ainda nos influencia para continuarmos de forma teimosa e de maneira tradicional a expressarmos nossas verdades interiores?

Acredito que, para muitos de nós, é preciso ainda sentir o prazer do contato. É ainda necessário tocar, cheirar, manusear o material. Misturar e escolher as cores, de definir os espaços que deverão ser pintados como forma ou pensados como fundo, a decisão de como trabalhar manualmente o assunto, o tema.

A artista Elisabete Belotto pertence a esta categoria: dos que ainda, apesar da tecnologia existente, necessitam expressar-se através de materiais tácteis. É contemporânea, ao pesquisar outros materiais a serem utilizáveis como suporte, como é o caso da lona de caminhão. É generosa, ao oferecer-nos a oportunidade de com ela participar de sua pesquisa e experienciar o material.

Fé, Cultura e Trabalho

 

Este é o nosso lema, baseado nos princípios que norteavam aqueles que há 180 anos aqui chegaram e deram a cara da nossa cidade. Devemos a eles a fundação do povoado que mais tarde chamaríamos de São Leopoldo, embora saibamos que não foram eles os pioneiros. Os indígenas já haviam descoberto o vale banhado pelo CURURUÁ e, mais tarde, a presença dos escravos negros na Feitoria do Linho Cânhamo.

De início, portanto, três culturas diferentes convivendo juntas, miscegenando-se algumas vezes, e que deram origem a este caldo cultural tão rico e variado de matizes, cheiros e gostos, acrescentado por outros povos que aqui também aportaram e ficaram.

Dizem que “Quem bebe a água dos Sinos permanece aqui ou volta sempre.”

Meu questionamento vai, no entanto, no sentido de como toda esta multiplicidade de culturas se organiza para manter-se fiel à sua tradição e não se perder nos modismos ditados pelos meios de comunicação? Ou, por outra, como o poder público pode auxiliar nesse sentido?

Sabemos que as comunidades alemã e italiana já estão organizadas em nosso meio, inclusive com o Museu Histórico de uma e a Societá de outra. Produzem eventos que remontam às suas origens e que nos dizem: estamos aqui, a história de nossos antepassados é rememorada.

Mas e os negros? Os índios? Ou, por outra, aqueles que nem sabem mais qual a sua cor de origem porque suas características já não são aparentes? Estas pessoas fazem o quê? Em que acreditam? Que trabalhos executam? Que tipos de organização social possuem?

Entendo que cada cidadão que aqui reside e organiza sua vida familiar e profissional precisa ter consciência de que o que faz é importante e que sua história, junto a de outras, contribui para o desenvolvimento da nossa cidade. Que aquilo que aprendeu com seus antepassados precisa ser registrado e transmitido às novas gerações porque também é importante.

Este resgate histórico dos que constroem nossa cidade precisa ser feito porque esta é a função maior de uma política cultural voltada para todos, que contempla as mais variadas manifestações culturais existentes, seja no campo do popular ou do erudito, e que precisa ser construída junto à própria população.

Justifica-se, deste modo, a criação da Secretaria de Cultura tão sonhada pelos agentes culturais desta cidade.

 

Suzane Wonghon

Artista Plástica e Professora

Rio dos Sinos, Estrada Viva

Exposição Grupo Arte 15 – Junho 2010 – Galeria Arte 15/SL

 

O Vale dos Sinos é assim denominado devido à sua localização geográfica às margens do Sinos. Nossa sobrevivência depende do mesmo. Somos tão dependentes de sua água quanto do ar que respiramos, econômica e socialmente. Não poderíamos imaginar nossa vida sem a sua existência. Dele retiramos o alimento, energia, transporte, lazer.

Entretanto, torna-se necessária uma reflexão sobre o assunto. Se o mesmo nos traz tantos benefícios, por que viramos as costas para ele? Por que esquecemos a beleza de suas margens, a pureza de suas águas nas nascentes, os seres que o habitam, e o tratamos tão mal? Será que acreditamos que ele será eterno, que sempre encontrará uma maneira de se recompor? Se a vida das cidades é possível devido à utilização de sua água, não seria lógico devolvê-la da mesma forma como a tomamos de seu leito, sem os detritos resultantes do seu uso?

Estas e outras questões, como os crimes ambientais localizados, resultando as recentes mortandades de peixes, exigem uma profunda reflexão sobre o assunto e ações que modifiquem nossa postura e relação com o nosso Sinos.

Preservar o que existe, recuperar o que é possível, lamentar o irremediável: este é nosso legado e missão em relação às futuras gerações.

As vacas longavida são ecológicas.

1. Os mamíferos mamam leite.

Os seres humanos são mamíferos.
As vacas são mamíferas.
As vacas produzem o leite que alimenta sua prole e serve para o consumo dos humanos.
O leite da vaca, destinado à alimentação dos humanos, é armazenado em embalagens longavida, de forma a torná-lo, por mais tempo, próprio para seu consumo.
Os mamíferos longavida são produzidos a partir de embalagens longavida vazias.
As embalagens longavida, que armazenam o leite destinado à alimentação dos mamíferos humanos, após perderem sua função original, armazenar leite, e serem, por isso, descartadas, assumem nova função: estrutura para novos mamíferos.

2. As vacas ecológicas são produzidas com embalagens longavida vazias

As embalagens vazias são utilizadas como módulos que colados uns aos outros servem como estrutura ou suporte para a confecção de objetos, no caso, vacas ou outros mamíferos. Estas estruturas são cobertas com camadas de papel jornal e cola, até formar uma crosta resistente em papier maché. Tanto as embalagens quanto o papel jornal são materiais que seriam descartados após sua utilização original.
Reciclar ou dar nova função ao que descartamos são as tarefas urgentes do mundo atual. A natureza se esgota. Toneladas de resíduos sólidos são descartadas diariamente sem darmos conta de sua desinformação. Quando reciclado, o resíduo retorna para a economia como matéria prima evitando que novas fontes naturais sejam utilizadas.
Permanecer informado com outra função é dar uma vida útil ao dejeto. Utilizar sem desinformar, reaproveitar funcionalmente as embalagens longavida e o papel jornal para a elaboração dos mamíferos é condizente com o olhar para a natureza e futuro do planeta. Além de criativo, é ecológico.

3. Produzir um objeto cultural utilizando produtos culturais existentes é uma atitude inteligente e contemporânea.

Além da questão ecológica, do dano produzido à natureza para que um produto cultural seja produzido e consumido (em maior ou menor escala o dano existe, reciclando ou não), há a questão cultural. O tempo, a pesquisa, o conhecimento necessários para encontrar a melhor forma, funcional e atraente, de fácil leitura e compreensão. Todos os produtos culturais que consumimos refletem o legado cultural desenvolvido e acumulado pela humanidade através dos séculos, através de questionamentos e descobertas.
Uma embalagem para armazenar leite ou uma página de jornal são produtos culturais e refletem, portanto, este legado. A cultura, a informação, o objeto informado através da página de jornal e da caixa de leite são desta forma matéria prima do ponto de vista material e intangível para execução de um novo produto cultural, a vaca longavida.

4. Portanto, a partir do entendimento e fruição do material utilizado para a concepção e execução dos objetos em papier maché e embalagens longavida, podemos afirmar que as vacas longavida são ecológicas.

Texto para orelha do livro “Lápis, pincel, cinzel” Historia das Artes Plásticas em São Leopoldo, 1950/2000

 

Autora: Edi Daudt,  Casa Leiria, 2016

Esta é uma obra necessária.

São Leopoldo a muito merecia um registro sobre seus artistas visuais e os acontecimentos vivenciados pelos mesmos. Resgatar através da pesquisa nem sempre registrada, sabemos, uma tarefa minuciosa, com muitas dúvidas sobre o que seria mais significante ou que melhor retratasse cada período.

É através da história da arte que aprendemos a conhecer sobre os hábitos, organização social, valores das antigas civilizações. É através dos registros pictóricos e arquitetônicos dos grandes mestres ou anônimos que desvendamos a caminhada da humanidade da pré-história aos dias de hoje. Sabemos, porque os historiadores encarregaram-se de organizá-los em ordem cronológica. A sistematização e o posterior registro escrito, antes que o tempo apague, é importante.

Com este entendimento, a Autora lançou-se sobre este desafio: organizar a história das artes visuais da cidade, dispersa em periódicos, memória de ativistas culturais, catálogos de exposições, editais de salões. Um período extenso, da chegada dos imigrantes germânicos aos tempos atuais.

 Num primeiro momento, discorre sobre a produção plástica dos descendentes dos próprios imigrantes, para, a partir da década de 50, relatar a influência  e engajamento dos artistas às novas correntes e movimentos mundiais.

Edi Daudt, pintora e professora de artes, revela com este livro, uma nova faceta de sua personalidade, a de historiadora. Suas aulas de história da arte são, agora, organizadas em forma escrita.

Agradeço a honra do convite para escrever esta apresentação, desejando muito sucesso nesta nova carreira.

 

Suzane da Rosa Wonghon

artista visual e arte-educadora